sexta-feira, 30 de outubro de 2015

O Sacerdócio Universal e a Reforma Prostestante

A Reforma protestante teve nomes importantes como Martinho Lutero, Ulrico Zuínglio, John Calvino e outros. Lutero conhecido pelas suas noventa e cinco teses, o monge agostiniano descobriu por intermédio das escrituras que o crente seria justificado pela fé, defendeu também o sacerdócio universal de todos os cristãos. Ulrico Zuínglio, o reformador de Zurique que foi influenciado por Erasmo de Roterdã na sua formação teológica. Zuíglio rompeu com alguns costumes da igreja de Roma, como a proibição de poder comer carne na quaresma, na concepção do reformador tudo teria que passar pelo crivo das sagradas escrituras.
A reforma teve outras fazes importantes, dentre elas, o surgimento dos anabatistas, estes eram conhecidos como reformadores radicais. Inicialmente, os reformadores radicais apoiaram reforma de Zuiglio, mas com passar do tempo começaram a ter divergências com o batismo infantil. Os anabatistas, ou rebatizadores, eram conhecidos pelo seu fanatismo e sua radicalidade.
John Calvino, conhecido como reformador de Genebra foi também um personagem de suma importância para Reforma Protestante. A intenção de Calvino era fazer de Genebra uma cidade modelo para Europa, onde que através da educação e organização da igreja a cidade pudesse ser um modelo a seguir. Calvino não foi conhecido apenas como um teólogo teórico, mas também por suas práticas, reduziu a miserabilidade e o analfabetismo em Genebra.
Uma das marcas mais relevantes da Reforma protestante foi a centralidade das escrituras, tendo como consequência os cinco Solas:  Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola Fide, Soli Deo Gloria.  Diante dessa conjuntura, queremos destacar uma predominância reformada, que é o Sacerdócio Universal de todos os crentes.
Dentre outros fundamentos defendidos pelos reformadores do século XVI está o Sacerdócio universal de todos os crentes. Esse ponto parte da premissa que não há uma centralização de um sacerdote como podemos ver no Antigo Testamento e na Idade Média, onde pode-se ver a centralidade no clero, tornando-se então, uma classe separada dos leigos. Diante deste viés, os reformadores defenderam que todos crentes são participantes desse sacerdócio a partir de Jesus Cristo, (1 Pedro 2.5; Apocalipse 1.5-6; 5.9-10).
O Sacerdócio Universal aponta para a liberdade, nos remete a uma prática comunitária de vivenciar a fé cristã, onde todo cristão é um ministro, um agente missionário. Nesse sentido todos os cristãos são leigos.. 
Diante dessa marca importante da Reforma Protestante, o sacerdócio de todos os crentes, corre o risco de ficar apenas nas análises teórica frente aos irrelevantes discursos que podemos ver no contexto de igreja brasileira.  Estamos em tempos que a proliferação de falsos ensinos tem se espalhado, a cada dia ser coerente e relevante no discurso se torna um elemento de exclusão diante da perspectiva dos consumidores e vendedores da fé, no contexto mercadológico da religião no Brasil.
Vemos muitos líderes no Brasil centralizando o poder em suas personalidades, movimentos como G12, M12, MDA, que muitas vezes valorizam de forma exacerbada a liderança de um indivíduo. Esses movimentos colocam pré-requisitos para que os novos convertidos se sintam incluídos em suas respectivas realidades.
A partir disso, temos uma igreja movida pela lógica do resultado, onde se faz o que dá certo, não o que é certo. No mês que comemoramos a Reforma Protestante, precisamos mais do que nunca de uma reforma na igreja. Os resultados não podem ser o motor que move a igreja, o que deve mover a ação da igreja é espirito profético que denuncia o erro e aponta um caminho de esperança. Isso será possível, apenas quando voltarmos a enfatizar os pontos da reforma, principalmente o que enfatiza o Sacerdócio Universal de todos crentes, onde somos remetidos que não há discípulo maior ou menor, mas, todos são discípulos e discípulas Jesus Cristo, responsáveis pela proclamação do evangelho, não há judeu, grego, homem ou mulher, somos a partir de Jesus livres de toda opressão que a religião possa nos impor. Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia, Sola Fide, Soli Deo Gloria. Viva a Reforma Protestante!


Antonio Carlos de Souza Prado


Referências bibliográficas:

CAIRNS, Earle E., O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã (São Paulo: Vida Nova, 1988). Uma das melhores histórias da igreja em um só volume disponíveis em português.

WILLIAMS, Terri, Cronologia da história eclesiástica em gráficos e mapas (São Paulo: Vida Nova, 1993). Os ótimos gráficos permitem visualizar facilmente alguns dos temas mais importantes da história da igreja.

BEEKE, Joel e outros. Sola Scriptura: numa época sem fundamentos, o resgate do alicerce bíblico. São Paulo: Cultura Cristã, 2000.

HARRIS, Laird. Inspiração e canonicidade das Escrituras. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

A igreja e o zelo com os pequeninos

Texto: Mateus 18.1-14

Uma fala direta e até dura. Jesus não poupa sentimentos para mostrar o quão importantes são as crianças e como devem ser tratadas de forma digna, com muito cuidado para que não se percam. O texto de Mateus 18 é um texto muito conhecido em nossas igrejas e também um texto que gera desafios para a igreja: como inserir a criança no ambiente cúltico? Como deve ser o cuidado no dia a dia da igreja com relação a elas?
Falar de crianças após ler este texto tende a se tornar uma tarefa muito agradável (pelo menos para mim), pois me faz refletir o quão especiais elas são, na pureza, na sinceridade... É muito difícil não se deixar envolver na alegria de ver uma criancinha rindo, brincando alegremente, aprendendo a engatinhar, aprendendo a andar, se embolando com as palavras que ainda não aprenderam a falar direito, isso tudo alegra muito o ambiente. Enfim, falar de criança gera esse sentimento de satisfação. Mas também existem os casos de crianças com atitudes nada graciosas e que merecem correção. Uma cena que eu, particularmente,  acho muito feia é de criança pirracenta, é muito incômodo. Assim como vários outros exemplos que podem ser dados. Mas fato é que devemos cuidar delas para que não se percam (v.14).
Falar de crianças após ler este texto pode ter essa conotação agradável como dito anteriormente,  mas também precisa gerar em nós uma reflexão profunda acerca de como elas têm sido tratadas no contexto onde estamos inseridos. O pastor Ariovaldo Ramos, em seu livro "A Ação da Igreja na Cidade", dá um exemplo muito forte comparando esse relato de Jesus colocando uma criança no centro, propondo porém a imaginarmos que aquela criança seja uma das crianças que estamos habituados a ver entregues ao abandono na Praça da Sé, em São Paulo. Jesus poderia apresentá-la como um símbolo do que há de melhor na humanidade? Infelizmente não,  pois a sociedade brasileira tem descaracterizado suas crianças,  tranformando-as em símbolo daquilo que há de pior. Isso é muito duro, gera um peso de responsabilidade muito grande. Que tipo de ações temos prestados em prol de ajudar nossas crianças?  Devemos carregar vivas em nossas mentes as palavras de Jesus, de que "ai daquele por quem o escândalo vem". Não devemos escolher a omissão, no que tange ao cuidado a esses pequeninos. Jesus usa ainda outro exemplo cofrontador, apresentado no versículo 6,  de que melhor é amarrar uma grande pedra (mó de azenha) e se jogar nas profundezas do mar do que escandalizar qualquer um dos pequeninos.
Devemos compreender o tamanho amor que Deus tem pelas criancinhas,  devemos amá-las com toda intensidade. Uma igreja que cuida de suas crianças é uma igreja que agrada (e muito) o coração de Deus. E em especial,  nós metodistas,  temos o exemplo em nossa história. John Wesley se dedicava em seus trabalhos com as crianças, fundando escolas e orfanatos, para que todas as crianças,  principalmente as mais pobres, pudessem ser cuidadas e instruídas. É interessante que as escolas eram criadas no intuito de alfabetizá-las longe das práticas pagãs. Eram ensinadas a ler, escrever e contar, antes e depois das aulas também eram catequizadas.
Exemplos então não nos faltam, independente de sermos metodistas, batistas, presbiterianos, assembleianos, católicos... Cuidar das crianças é uma missão para todos nós. Que possamos cumpri-la com muito temor, zelo e amor. Deus nos abençoe!


Clayton Senziani

terça-feira, 14 de julho de 2015

A igreja que conquista a cidade

"Ganhar a cidade para Jesus", você com certeza já ouviu isso, mas o que significa isso para você? Na igreja somos estimulados a conquistar nossa cidade, somos motivados a pregar o evangelho, ir em busca de almas, mas tudo isso para o que exatamente? Para encher os templos? Será que o projeto de Deus para a humanidade se limita a encher um espaço?
Ao longo das Sagradas Escrituras, vemos a vontade de Deus inclinada para a justiça, misericórdia, amor... Vemos isso nos profetas levantados pelo Senhor para alertar o povo e seus governantes sobre a importância da justiça. Mas o que isso tem a ver com o questionamento acima? Simplesmente tudo a ver! Conquistar uma cidade para o Senhor não se resume a colocar 50% da população dentro do templo, vai muito além disso. É preciso discipulado para que as pessoas alcançadas pela mensagem transformadora do evangelho tenham reluzentes em suas vidas os valores do Reino de Deus. Não basta apenas ser sal, é preciso salgar! (Mt 5.13).
Ganhamos verdadeiramente uma cidade para Cristo quando levamos à ela os valores do Reino, quando em nosso papel de cidadãos transparecemos o amor e justiça de Deus. Uma cidade genuinamente conquistada por Cristo é uma cidade onde reina a justiça, mas isso só é alcançado quando cada um de nós se compromete a viver verdadeiramente a vida de Cristo, é necessária transformação verdadeira, é preciso santidade (1Pe 1.15). Santidade não se resume a abrir mão de certas práticas (corrupção, adultério, roubos, mentiras...) mas é também aderir práticas (amar, praticar justiça, viver a verdade...). Discípulos de Jesus transformam realidades quando vivem os ensinamentos recebidos, é impossível impactar uma cidade se os discípulos, um a um, não forem transformados pelo poder do Espírito Santo de Deus. A igreja precisa saber "olhar além das quatro paredes", perdemos muito tempo e gastamos muitos esforços quando apenas canalizamos nossas forças em atividades somente para dentro das igrejas.
Não é intenção deste texto afirmar que a igreja reunida seja desnecessário ou obsoleto, muito pelo contrário. A igreja tem um papel fundamental no que tange o discipulado. Nas comunidades aprendemos a importância de viver como Cristo no ensinou, e recebemos também seus ensinamentos. O templo é um lugar de instrução, de comunhão, onde desfrutamos, ao lado de outros irmãos, a presença de Deus e seu poder. Mas viver para Cristo não se limita somente a isso.
Uma igreja que busca conquistar a cidade onde está precisa ter uma visão ampla, precisa entender sua responsabilidade em transbordar a graça de Deus. Foi citado neste texto que devemos salgar a terra, e Jesus foi muito claro em dizer que já somos o sal, mas também concluiu afirmando que o sal pode se tornar insípido. A igreja já é o sal, mas ela tem salgado? O sal perde seu sabor quando misturado com outras substâncias diferentes das suas. A igreja perde seu potencial e diferencial quando permite misturar em si valores que não são os de Cristo.
A responsabilidade está em nossas mãos, precisamos entender que a transformação deve começar em cada um de nós. Uma igreja que ganha a cidade é uma igreja de indivíduos transformados e que vivem no seu cotidiano os valores do Reino de Deus. E finalizo com uma fala do pastor Ariovaldo Ramos: "Queremos que mesmo os que não se converterem sejam afetados pela presença de Deus na cidade e que, por causa da palpabilidade desta presença, pensem muito antes de levantar-se contra a vontade de Deus".

Clayton Senziani

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Multiplicação... para quem?

Texto: Marcos 6.30-44

            O relato da multiplicação dos pães e peixes aparece nos quatro evangelhos, mas meu texto favorito é o de Marcos por conter alguns elementos que acho muito interessante, como por exemplo, o fato de Jesus ter escolhido ir para aquele lugar para descansar junto com seus discípulos (v.31). Talvez isso possa ser, para alguns, um detalhe isolado do texto, mas na verdade é algo que merece ser observado, pois mesmo Jesus estando num lugar que ele escolheu para repousar, isso não o impediu de fazer daquele lugar um lugar de serviço aos necessitados. Jesus poderia ter aberto mão de atender as necessidades daquelas pessoas que o seguiram até aquele lugar, por estar cansado, mas essa não foi a opção escolhida por Ele.
            No versículo 37 chegamos onde começa o desafio maior do relato. Após ter ensinado o povo e curado seus enfermos, Jesus desafia seus discípulos a alimentarem aquela multidão. A ideia é confrontada com ironia por eles (v.37), mas Jesus insiste. Então ele pega aquilo que os discípulos tinham em mãos para alimentar aquela multidão: 5 pães e 2 peixes. O pastor Ariovaldo Ramos fala algo que deve nos fazer pensar com relação a esse cenário: “Quando dá o desafio, Deus dá também a provisão, mesmo que a primeira vista pareça absolutamente insuficiente[1]. Poderia parecer loucura, mas era com aqueles elementos que os discípulos alimentariam a multidão.
            O final já conhecemos, os pães e peixes são multiplicados, o povo come e sobra. A multiplicação se deu para servir aquela multidão faminta. Ao olharmos da perspectiva de Jesus e seus discípulos, vemos que a multiplicação não veio para que eles ostentassem alimento, mas sim para que houvesse partilha. Vivemos uma dura realidade onde muito se ouve falar em buscar as bênçãos de Deus mas sem gerar junto um sentimento de cuidado para com o próximo. Para que buscar a multiplicação? Para guardar para mim apenas? Prosperidade, na Bíblia Hebraica, não é necessariamente obter vantagens pessoais ou acumular riquezas, mas sim promover a paz de Deus (shallom) na terra, entre as pessoas[2]. Ser próspero é ser um abençoado que partilha, que abençoa quem está a volta.
            Desafio você, leitor, a começar a ler as Sagradas Escrituras com olhar de servo de Deus e também do próximo. Uma das grandes crises da igreja contemporânea é que vivemos uma escassez de servos, pessoas cada vez mais querem ser servidas por Deus e se esquecem de servir ao próximo. Jesus amou compassivamente aquelas pessoas famintas, precisamos ser como Jesus. Temos que entender a fome que marca as pessoas ao nosso redor, perceber as consequências dessa fome e tornar nossa igreja um lugar de refúgio para essas pessoas, onde o amor de Deus se manifesta em nossas vidas[3].

Clayton Senziani



[1] RAMOS, Ariovaldo. Ação da Igreja na Cidade. São Paulo, SP: Hagnos 2009. P. 26.
[2] SIQUEIRA, Tércio Machado. Tirando o pó das palavras: história e teologia de palavras e expressões bíblicas. São Paulo: Cedro, 2005. p. 143.
[3] RAMOS, Ariovaldo. Ação da Igreja na Cidade. São Paulo, SP: Hagnos 2009. P. 27.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Uma fé que gera cuidado

Texto: Tiago 2.14-18


Que proveito se tira de nossa fé? Neste texto, a Palavra nos ensina sobre o que nossa fé pode causar na vida daquele que está próximo de nós. A fé em Cristo é como um rio que desemborca em obras, é impossível dizer que amo e creio em Cristo e não praticar boas obras, pois se eu realmente amo a Deus eu também anseio em realizar a Sua vontade. O versículo 18 mostra muito claramente isso e nos traz uma mensagem desafiadora: "... te mostrarei minha fé PELAS minhas obras". Isso sim é ser espelho de Cristo, não é apenas falando que crê, mas vivendo a fé.
            O termo grego “óphelos”, traduzido por “proveito” (que aparece nos versículos 14 e 16), traz o sentido de benefício. A teologia de Tiago afirma que a fé precisa trazer benefícios para outras pessoas através da vida da pessoa que a tem. A expressão “tirar proveito” em nossos dias pode ser entendida de diversas formas, inclusive de forma negativa, como por exemplo os criminosos que tiram proveito de pessoas de idade avançada e de suas fraquezas para praticarem delitos, ou políticos corruptos que tiram proveito de sua condição de prestígio para desviar verbas destinadas a população... Mas em nosso contexto de igreja, o proveito de nossa fé pode se expressar, entre outras coisas, por meio do discipulado. A igreja é a comunidade formada por pessoas que precisam de cuidados que podem ir desde o cuidado físico ao cuidado espiritual. O discipulado é um meio de cuidarmos das pessoas e tratá-las à partir de suas necessidades. Para que haja discipulado é necessário que haja amor, sinceridade, misericórdia, paciência...
            Discipulado é caminhar junto, é estar à disposição da outra pessoa para que possam crescer juntas, enfrentar as dificuldades juntas, rirem e celebrarem juntas. Como diz uma canção bastante conhecida no meio evangélico: “somos filhos da graça”. Essa graça que recebemos por intermédio da fé em Cristo Jesus, essa fé precisa gerar em nós algo de proveito para a vida daqueles que estão ao nosso redor. Nossa fé precisa gerar em nós o sentimento de cuidado, para assim edificarmos como corpo de Cristo até que Ele venha. E que possamos dizer: “Te mostrarei a minha fé pelas minhas obras”.

Clayton Senziani
(Texto publicado no boletim da Igreja Metodista em Osasco dia 14/06/2015)

segunda-feira, 11 de maio de 2015

A honra que lhe é devida

Texto: Malaquias 1.6-9
“O filho honrará o pai (...) e, se eu sou Pai, onde está a minha honra?” (Malaquias 1.6a)

O sentido de honra que aparece neste texto (kabad) é uma alusão a honra citada em Deuteronômio 5.16, é honra no sentido de respeitar, reconhecer a grandeza. A citação de Deuteronômio é proposital, naquele momento o povo vivia um tempo complicado, envolvendo o escândalo dos sacerdotes com suas faltas cultuais e infidelidade, e também os escândalos dos casamentos mistos e dos divórcios. Era um tempo de crises e o profeta inspira-se no Deuteronômio e também em Ezequiel para profetizar ao povo exigindo a honra devida a Deus, e que Ele exige de seu povo uma religião interior e pureza[1].
Os sacerdotes estavam agindo de qualquer forma com relação ao culto prestado ao Senhor. Após a cobrança pela honra o profeta afirma no versículo 7 que os sacerdotes ofereciam alimentos impuros (pão imundo, ARC[2]) no altar e perguntavam em que profanavam ao Senhor. A acusação continua no versículo 8 quando questiona-se aos sacerdotes sobre qual seria a reação do príncipe ao receber aquilo que era sacrificado ao Senhor, tamanha era a presunção com relação ao culto naquele momento. O Senhor exige honra!
Somos hoje o templo vivo do Senhor (1Co 3.16), nossa vida é um culto contínuo a Deus, no qual o Senhor nos chama a sermos sacrifício vivo, santo e agradável (Rm 12.1). É a vida e não o sacrifício de animais que agora é o verdadeiro sacrifício do povo de Deus. Os sacerdotes foram cobrados por entregar ao altar de Deus animais cegos e coxos, o sacrifício era feito de qualquer maneira, sem a preocupação pela qualidade daquilo que era oferecido. Precisamos hoje honrar nosso Deus oferecendo-lhe nossa vida como sacrifício santo, devemos entregar-Lhe nossa vida de forma integral para seu serviço nesse mundo que carece da maravilhosa graça e ação de nosso Deus.
Onde está minha honra?”, que essa pergunta possa ser respondida quando o Senhor olhar para nossa vida.

Clayton Senziani




[1] Comentário Bíblia de Jerusalém
[2] Bíblia versão Almeida Revista e Corrigida

segunda-feira, 4 de maio de 2015

O massebá e a asherá de nossos dias


No mês de novembro do ano passado foi o mês em que tomei a decisão de estudar o livro de Juízes e foi uma experiência muito boa. Este livro retrata abertamente as idas e vindas do povo de Israel quanto a sua fidelidade a Javé. A todo momento percebe-se a dinâmica dessa relação, onde num dado momento o povo se encontra em uma situação de idolatria a deuses de outros povos, então são castigados por Javé. O povo é atacado e oprimido por outros povos, um bom exemplo está no capítulo 6 que narra a opressão dos midianitas, onde eles destruíam toda e qualquer plantação que o povo de Israel viesse a cultivar, isso provocou o arrependimento por parte do povo israelita e Javé levanta Gideão para livrá-los das mãos dos midianitas.


O intuito deste texto é apresentar um pouco da idolatria do povo cananeu (sistema religioso cujo o povo israelita acaba aderindo em diversos momentos) e trazer para a realidade vivida atualmente.

La cultura y la religión de Canaán
Foto tirada do blog "Las Deidades Cananeas"
A religião de Canaã era uma religião ligada ao cotidiano dos agricultores, seus cultos eram ligados aos cultos das forças da natureza, à fertilidade do solo e à vegetação. A preocupação era pela produção, eles clamavam para que no fim pudessem ter sucesso na produção agrária. O culto era feito em elevações ou montes, em lugar aberto no meio da natureza. Aqui chegamos ao ponto chave deste texto. Dois eram os elementos básicos para esse culto: o massebá e a asherá. O massebá (2Rs 3.2) era um símbolo da divindade masculina. Sua forma era a de uma estrela ou poste de pedra, sinal mágico que ligava a divindade masculina à terra, feminina, realizando a imagem simbólica da inseminação. A asherá (1Rs 15.13) era um símbolo da divindade feminina, em geral um pedaço de madeira fincado no solo ou, às vezes, uma árvore viva. Esses dois símbolos eram mantidos juntos, lado a lado ou acoplados, simbolizando a relação que dá origem à vida da natureza.[1]

O povo israelita se rendeu em diversas vezes aos cultos dos cananeus (apresentado acima), desobedecendo uma ordem de Javé, o mandamento para não adorar outros deuses (Ex 20.3). Esse cenário apresentado pode trazer uma reflexão interessante sobre a vida cristã em nossos dias, onde nos deparamos com diversos casos de pessoas que trocam o verdadeiro culto à Deus, trocam os mandamentos, por um sistema de idolatria que possa parecer mais conveniente. Pode ser que não seja o caso de adorar uma divindade para ter o sucesso no plantio, mas talvez uma entrega à avareza, a busca incessante do sucesso próprio ao invés da santificação. A idolatria dos cananeus se pautava na busca da auto-satisfação e isso não se distancia do contexto atual, onde não se tem o massebá e a asherá propriamente ditos, mas sim uma mentalidade distorcida que traz danos tão grandes quanto os elementos apresentados.

Que este texto possa ser proveitoso. E que possamos também meditar que a mesma idolatria que criticamos tanto de outros seguimentos religiosos, com relação as suas imagens, não venha ser também nossa pedra de tropeço, pois é muito fácil trocarmos a idolatria por imagens pela idolatria do nosso próprio ego.

Deus nos abençoe ricamente!

Clayton Senziani




[1] STORNIOLO, Ivo. Como ler o livro dos Juízes: aprendendo a ler a história. São Paulo: Paulinas, c1992. p. 29 (Como ler a Biblia). 

Uma escatologia que mova missões e missões movida por escatologia


“Fulano será o Anticristo!”, “A Besta vai se manifestar naquele país!”, “O arrebatamento virá em poucos anos!”. Você certamente já deve ter ouvido alguma dessas frases ou algo muito parecido quando o tema é escatologia. Escatologia é o estudo das últimas coisas, estudo que chama a atenção e cria expectativas, pois, de um modo geral, as pessoas possuem muitas curiosidades quando se trata do porvir. É comum vermos que se crie um alvoroço entre as pessoas, com muitas especulações, ideias, suposições, palpites... Mas conforme é bem colocado pelo teólogo Juan Stam: “De todas as disciplinas teológicas, a escatologia tem sido aquela em que mais se especulou e menos se respeitou o texto bíblico”.


            Dia após dia novidades aparecem e saltam aos nossos olhos. Uma catástrofe aqui e acolá, um estouro político em determinado país... Sempre que algo do tipo acontece, se levantam aqueles e aquelas que acabam dizendo que isso é mais um “sinal do fim”, é mais uma prova daquilo que afirmam estar relatado nas Escrituras.

            Quando falamos em escatologia vemos muito mais especulações e palpites do que um despertar missionário! A Bíblia nos mostra em 1Pedro 3.8-17 o que devemos fazer. Novamente citando o teólogo Juan Stam em seu livro “Profecia Bíblica e Missão da Igreja”, é inútil uma escatologia que não mova missões e missões que não mirem escatologia. É necessário que a ideia de um final nos mova para a vivência, para a prática da justiça, obras de amor. 

O ponto central da escatologia é o Reino de Deus! À partir do momento em que esse foco se perde, tendemos a seguir por caminhos perigosos. Se a escatologia não nos move para a ação, devemos fazer uma reavaliação de nossa vida cristã. Devemos ser impulsionados a viver conforme diz o texto bíblico: “Sede todos de um mesmo sentimento, compassivos, amando os irmãos, entranhavelmente, misericordiosos e afáveis, não tornando mal por mal ou injúria por injúria; antes, pelo contrário, bendizendo, sabendo que para isto fostes chamados, para que, por herança, alcanceis a bênção” (1Pedro 3.8,9).

O intuito dessa breve reflexão é manter viva a ideia que não basta ficar apenas no campo da especulação, tentando adivinhar como as coisas se desenrolarão, mas que a escatologia deve impulsionar-nos para a missão, para a ação evangelística da qual fomos todos chamados. Mais do que discutir sobre missões, precisamos vivê-la. 

Clayton Senziani

O exemplo de Charles Wesley para a música cristã

Charles Wesley
Charles Wesley nasceu em 18 de dezembro de 1707, era o filho caçula de Samuel e Susanna Wesley. Charles se mostrou uma pessoa voltada para as artes, fato comprovado com seu Bacharel em Artes em 1730 e posteriormente o Mestrado em Artes em 1732.

Seu grande destaque veio por meio de suas músicas. As músicas compostas por Charles Wesley eram verdadeiras teologias cantadas. O que seu irmão John Wesley escrevia e pregava, Charles transformava em música, na forma de hinos, para que a congregação pudesse cantar como louvor, oração e exortação. Era de comum acordo entre os irmãos John e Charles que essa combinação de dons era benéfica para a comunidade, instruir a teologia metodista através de hinos. Esse seria um meio da teologia alcançar os corações das pessoas que as ouvia. De fato era um bom caminho e segue sendo para os dias atuais, onde músicas continuam chamando a atenção do povo e podem ser usadas como um meio de ensino de uma teologia saudável.

        As músicas de Charles Wesley possuíam também uma característica marcante que era o tema do amor, tanto é que ele usa a palavra amor mais de 1500 vezes! Exemplos disso são os hinos "Não deixarei de ter amor", "Como contar de Deus o amor", "Vem Santo e Verdadeiro Deus"... Músicas que educavam o povo a amar, mostrar que Deus é amor e o quão importante é que se entenda isso. Ao contrário de canções que criam sentimentos de rivalidade, vingança, divisão e por aí vai...
Com base em seu perfil musical mais amoroso, Charles Wesley também se mostrava contra as guerras. Isso não o impedia de ser leal à monarquia inglesa (fato declarado pelo mesmo). Esse seu pensamento se evidencia claramente em sua canção "Messias, Príncipe da Paz"Kimbrough afirma que Charles Wesley deixa claro que onde existe guerra não existe reino de Deus.

Devemos confessar que teu reino aí não está; Quem, preparado pelo teu adversário, delicia-se com o sangue humano, demonstram que tem Apoliom como rei, e Satan é seu deus.[1]
            
            Outro aspecto das canções de Charles são o bom número de poemas que refletem sua vida devocional e preocupação do ensino religioso em família. Ele também escrevia orações feitas por ele em versos, num impulso quase incontrolável. Não só orações se tornavam em versos por Charles Wesley, mas também passagens bíblicas. Os hinos "Prepara a Mesa do Meu Coração" "Quando em Casa Descanso" são exemplos disso. Ambos provém do mesmo poema, baseados em trechos do livro de Deuteronômio, numa ideia de destacar o valor das Sagradas escrituras. Mais uma atitude louvável, hinos compostos em comprometimento com aquilo que é dito através das Escrituras, não compostos à partir de sentimentos mesquinhos e individuais.

            Com base no apresentado, nota-se que as músicas de Charles Wesley eram uma expressão daquilo que deveria ser ensinado para a comunidade (teologia), era também uma expressão do amor, expressava a vida devocional de Charles, sua oração e ressaltando a importância das Sagradas Escrituras. Com isso, conclui-se que a música de Charles derivava daquilo que era ensinado à luz da Bíblia.

           À partir daí, é possível fazer um paralelo com aquilo que é predominante hoje. No capítulo 5 do livro "Mil Vozes Para Celebrar"[2]Magali do Nascimento Cunha faz um destaque na música gospel contemporânea. Um dos destaques feitos por ela é de como a música é vista hoje nas comunidades. Um paralelo interessante que pode ser feito à partir de sua fala é a posição de prestígio que a música ocupa hoje, onde a música, em muitos casos, dita a regra de conduta cristã. Em especial no Brasil, onde boa parte da população não gosta de ler, o meio de doutrina utilizado são as músicas. Daí, ao olharmos para a qualidade de letras, vemos letras muito boas em contraste com letras muito ruins, músicas que fazem sucesso, tanto boas quanto as ruins. Isso acaba ocasionando uma série de complicações de entendimento no povo cristão brasileiro.


            Magali também discute acerca do uso das músicas. Na atualidade, a música no meio religioso é bastante utilizada como meio de gerar eventos para atrair pessoas, como louvorzões, shows e etc. Um outro contraste que pode ser feito com relação ao uso da música de Charles Wesley. Conforme foi visto no início deste texto, Charles tinha a intenção do ensino em suas músicas, transmitindo a teologia de seu irmão John Wesley para os ouvintes, cantando também poemas inspirados em textos bíblicos e hinos produzidos para propagar a mensagem do amor de Deus.

            O tema da música é um tema amplo, que cabe diversas discussões em diferentes áreas e pontos de vista. Com o modelo musical de Charles Wesley, pode-se aprender bastante acerca do uso da música no meio congregacional, com um ato de ensino para ser passado à igreja.

Clayton Senziani




[1] Messias, o Príncipe da Paz (primeira estrofe)
[2] RAMOS, Luiz Carlos (Org.). Mil vozes para celebrar: tricentenário do nascimento de Charles Wesley. Simei Ferreira de Barros Monteiro et al. São Bernardo do Campo: EDITEO, 2008. 236 p. ISBN 8588410787.