segunda-feira, 11 de maio de 2015

A honra que lhe é devida

Texto: Malaquias 1.6-9
“O filho honrará o pai (...) e, se eu sou Pai, onde está a minha honra?” (Malaquias 1.6a)

O sentido de honra que aparece neste texto (kabad) é uma alusão a honra citada em Deuteronômio 5.16, é honra no sentido de respeitar, reconhecer a grandeza. A citação de Deuteronômio é proposital, naquele momento o povo vivia um tempo complicado, envolvendo o escândalo dos sacerdotes com suas faltas cultuais e infidelidade, e também os escândalos dos casamentos mistos e dos divórcios. Era um tempo de crises e o profeta inspira-se no Deuteronômio e também em Ezequiel para profetizar ao povo exigindo a honra devida a Deus, e que Ele exige de seu povo uma religião interior e pureza[1].
Os sacerdotes estavam agindo de qualquer forma com relação ao culto prestado ao Senhor. Após a cobrança pela honra o profeta afirma no versículo 7 que os sacerdotes ofereciam alimentos impuros (pão imundo, ARC[2]) no altar e perguntavam em que profanavam ao Senhor. A acusação continua no versículo 8 quando questiona-se aos sacerdotes sobre qual seria a reação do príncipe ao receber aquilo que era sacrificado ao Senhor, tamanha era a presunção com relação ao culto naquele momento. O Senhor exige honra!
Somos hoje o templo vivo do Senhor (1Co 3.16), nossa vida é um culto contínuo a Deus, no qual o Senhor nos chama a sermos sacrifício vivo, santo e agradável (Rm 12.1). É a vida e não o sacrifício de animais que agora é o verdadeiro sacrifício do povo de Deus. Os sacerdotes foram cobrados por entregar ao altar de Deus animais cegos e coxos, o sacrifício era feito de qualquer maneira, sem a preocupação pela qualidade daquilo que era oferecido. Precisamos hoje honrar nosso Deus oferecendo-lhe nossa vida como sacrifício santo, devemos entregar-Lhe nossa vida de forma integral para seu serviço nesse mundo que carece da maravilhosa graça e ação de nosso Deus.
Onde está minha honra?”, que essa pergunta possa ser respondida quando o Senhor olhar para nossa vida.

Clayton Senziani




[1] Comentário Bíblia de Jerusalém
[2] Bíblia versão Almeida Revista e Corrigida

segunda-feira, 4 de maio de 2015

O massebá e a asherá de nossos dias


No mês de novembro do ano passado foi o mês em que tomei a decisão de estudar o livro de Juízes e foi uma experiência muito boa. Este livro retrata abertamente as idas e vindas do povo de Israel quanto a sua fidelidade a Javé. A todo momento percebe-se a dinâmica dessa relação, onde num dado momento o povo se encontra em uma situação de idolatria a deuses de outros povos, então são castigados por Javé. O povo é atacado e oprimido por outros povos, um bom exemplo está no capítulo 6 que narra a opressão dos midianitas, onde eles destruíam toda e qualquer plantação que o povo de Israel viesse a cultivar, isso provocou o arrependimento por parte do povo israelita e Javé levanta Gideão para livrá-los das mãos dos midianitas.


O intuito deste texto é apresentar um pouco da idolatria do povo cananeu (sistema religioso cujo o povo israelita acaba aderindo em diversos momentos) e trazer para a realidade vivida atualmente.

La cultura y la religión de Canaán
Foto tirada do blog "Las Deidades Cananeas"
A religião de Canaã era uma religião ligada ao cotidiano dos agricultores, seus cultos eram ligados aos cultos das forças da natureza, à fertilidade do solo e à vegetação. A preocupação era pela produção, eles clamavam para que no fim pudessem ter sucesso na produção agrária. O culto era feito em elevações ou montes, em lugar aberto no meio da natureza. Aqui chegamos ao ponto chave deste texto. Dois eram os elementos básicos para esse culto: o massebá e a asherá. O massebá (2Rs 3.2) era um símbolo da divindade masculina. Sua forma era a de uma estrela ou poste de pedra, sinal mágico que ligava a divindade masculina à terra, feminina, realizando a imagem simbólica da inseminação. A asherá (1Rs 15.13) era um símbolo da divindade feminina, em geral um pedaço de madeira fincado no solo ou, às vezes, uma árvore viva. Esses dois símbolos eram mantidos juntos, lado a lado ou acoplados, simbolizando a relação que dá origem à vida da natureza.[1]

O povo israelita se rendeu em diversas vezes aos cultos dos cananeus (apresentado acima), desobedecendo uma ordem de Javé, o mandamento para não adorar outros deuses (Ex 20.3). Esse cenário apresentado pode trazer uma reflexão interessante sobre a vida cristã em nossos dias, onde nos deparamos com diversos casos de pessoas que trocam o verdadeiro culto à Deus, trocam os mandamentos, por um sistema de idolatria que possa parecer mais conveniente. Pode ser que não seja o caso de adorar uma divindade para ter o sucesso no plantio, mas talvez uma entrega à avareza, a busca incessante do sucesso próprio ao invés da santificação. A idolatria dos cananeus se pautava na busca da auto-satisfação e isso não se distancia do contexto atual, onde não se tem o massebá e a asherá propriamente ditos, mas sim uma mentalidade distorcida que traz danos tão grandes quanto os elementos apresentados.

Que este texto possa ser proveitoso. E que possamos também meditar que a mesma idolatria que criticamos tanto de outros seguimentos religiosos, com relação as suas imagens, não venha ser também nossa pedra de tropeço, pois é muito fácil trocarmos a idolatria por imagens pela idolatria do nosso próprio ego.

Deus nos abençoe ricamente!

Clayton Senziani




[1] STORNIOLO, Ivo. Como ler o livro dos Juízes: aprendendo a ler a história. São Paulo: Paulinas, c1992. p. 29 (Como ler a Biblia). 

Uma escatologia que mova missões e missões movida por escatologia


“Fulano será o Anticristo!”, “A Besta vai se manifestar naquele país!”, “O arrebatamento virá em poucos anos!”. Você certamente já deve ter ouvido alguma dessas frases ou algo muito parecido quando o tema é escatologia. Escatologia é o estudo das últimas coisas, estudo que chama a atenção e cria expectativas, pois, de um modo geral, as pessoas possuem muitas curiosidades quando se trata do porvir. É comum vermos que se crie um alvoroço entre as pessoas, com muitas especulações, ideias, suposições, palpites... Mas conforme é bem colocado pelo teólogo Juan Stam: “De todas as disciplinas teológicas, a escatologia tem sido aquela em que mais se especulou e menos se respeitou o texto bíblico”.


            Dia após dia novidades aparecem e saltam aos nossos olhos. Uma catástrofe aqui e acolá, um estouro político em determinado país... Sempre que algo do tipo acontece, se levantam aqueles e aquelas que acabam dizendo que isso é mais um “sinal do fim”, é mais uma prova daquilo que afirmam estar relatado nas Escrituras.

            Quando falamos em escatologia vemos muito mais especulações e palpites do que um despertar missionário! A Bíblia nos mostra em 1Pedro 3.8-17 o que devemos fazer. Novamente citando o teólogo Juan Stam em seu livro “Profecia Bíblica e Missão da Igreja”, é inútil uma escatologia que não mova missões e missões que não mirem escatologia. É necessário que a ideia de um final nos mova para a vivência, para a prática da justiça, obras de amor. 

O ponto central da escatologia é o Reino de Deus! À partir do momento em que esse foco se perde, tendemos a seguir por caminhos perigosos. Se a escatologia não nos move para a ação, devemos fazer uma reavaliação de nossa vida cristã. Devemos ser impulsionados a viver conforme diz o texto bíblico: “Sede todos de um mesmo sentimento, compassivos, amando os irmãos, entranhavelmente, misericordiosos e afáveis, não tornando mal por mal ou injúria por injúria; antes, pelo contrário, bendizendo, sabendo que para isto fostes chamados, para que, por herança, alcanceis a bênção” (1Pedro 3.8,9).

O intuito dessa breve reflexão é manter viva a ideia que não basta ficar apenas no campo da especulação, tentando adivinhar como as coisas se desenrolarão, mas que a escatologia deve impulsionar-nos para a missão, para a ação evangelística da qual fomos todos chamados. Mais do que discutir sobre missões, precisamos vivê-la. 

Clayton Senziani

O exemplo de Charles Wesley para a música cristã

Charles Wesley
Charles Wesley nasceu em 18 de dezembro de 1707, era o filho caçula de Samuel e Susanna Wesley. Charles se mostrou uma pessoa voltada para as artes, fato comprovado com seu Bacharel em Artes em 1730 e posteriormente o Mestrado em Artes em 1732.

Seu grande destaque veio por meio de suas músicas. As músicas compostas por Charles Wesley eram verdadeiras teologias cantadas. O que seu irmão John Wesley escrevia e pregava, Charles transformava em música, na forma de hinos, para que a congregação pudesse cantar como louvor, oração e exortação. Era de comum acordo entre os irmãos John e Charles que essa combinação de dons era benéfica para a comunidade, instruir a teologia metodista através de hinos. Esse seria um meio da teologia alcançar os corações das pessoas que as ouvia. De fato era um bom caminho e segue sendo para os dias atuais, onde músicas continuam chamando a atenção do povo e podem ser usadas como um meio de ensino de uma teologia saudável.

        As músicas de Charles Wesley possuíam também uma característica marcante que era o tema do amor, tanto é que ele usa a palavra amor mais de 1500 vezes! Exemplos disso são os hinos "Não deixarei de ter amor", "Como contar de Deus o amor", "Vem Santo e Verdadeiro Deus"... Músicas que educavam o povo a amar, mostrar que Deus é amor e o quão importante é que se entenda isso. Ao contrário de canções que criam sentimentos de rivalidade, vingança, divisão e por aí vai...
Com base em seu perfil musical mais amoroso, Charles Wesley também se mostrava contra as guerras. Isso não o impedia de ser leal à monarquia inglesa (fato declarado pelo mesmo). Esse seu pensamento se evidencia claramente em sua canção "Messias, Príncipe da Paz"Kimbrough afirma que Charles Wesley deixa claro que onde existe guerra não existe reino de Deus.

Devemos confessar que teu reino aí não está; Quem, preparado pelo teu adversário, delicia-se com o sangue humano, demonstram que tem Apoliom como rei, e Satan é seu deus.[1]
            
            Outro aspecto das canções de Charles são o bom número de poemas que refletem sua vida devocional e preocupação do ensino religioso em família. Ele também escrevia orações feitas por ele em versos, num impulso quase incontrolável. Não só orações se tornavam em versos por Charles Wesley, mas também passagens bíblicas. Os hinos "Prepara a Mesa do Meu Coração" "Quando em Casa Descanso" são exemplos disso. Ambos provém do mesmo poema, baseados em trechos do livro de Deuteronômio, numa ideia de destacar o valor das Sagradas escrituras. Mais uma atitude louvável, hinos compostos em comprometimento com aquilo que é dito através das Escrituras, não compostos à partir de sentimentos mesquinhos e individuais.

            Com base no apresentado, nota-se que as músicas de Charles Wesley eram uma expressão daquilo que deveria ser ensinado para a comunidade (teologia), era também uma expressão do amor, expressava a vida devocional de Charles, sua oração e ressaltando a importância das Sagradas Escrituras. Com isso, conclui-se que a música de Charles derivava daquilo que era ensinado à luz da Bíblia.

           À partir daí, é possível fazer um paralelo com aquilo que é predominante hoje. No capítulo 5 do livro "Mil Vozes Para Celebrar"[2]Magali do Nascimento Cunha faz um destaque na música gospel contemporânea. Um dos destaques feitos por ela é de como a música é vista hoje nas comunidades. Um paralelo interessante que pode ser feito à partir de sua fala é a posição de prestígio que a música ocupa hoje, onde a música, em muitos casos, dita a regra de conduta cristã. Em especial no Brasil, onde boa parte da população não gosta de ler, o meio de doutrina utilizado são as músicas. Daí, ao olharmos para a qualidade de letras, vemos letras muito boas em contraste com letras muito ruins, músicas que fazem sucesso, tanto boas quanto as ruins. Isso acaba ocasionando uma série de complicações de entendimento no povo cristão brasileiro.


            Magali também discute acerca do uso das músicas. Na atualidade, a música no meio religioso é bastante utilizada como meio de gerar eventos para atrair pessoas, como louvorzões, shows e etc. Um outro contraste que pode ser feito com relação ao uso da música de Charles Wesley. Conforme foi visto no início deste texto, Charles tinha a intenção do ensino em suas músicas, transmitindo a teologia de seu irmão John Wesley para os ouvintes, cantando também poemas inspirados em textos bíblicos e hinos produzidos para propagar a mensagem do amor de Deus.

            O tema da música é um tema amplo, que cabe diversas discussões em diferentes áreas e pontos de vista. Com o modelo musical de Charles Wesley, pode-se aprender bastante acerca do uso da música no meio congregacional, com um ato de ensino para ser passado à igreja.

Clayton Senziani




[1] Messias, o Príncipe da Paz (primeira estrofe)
[2] RAMOS, Luiz Carlos (Org.). Mil vozes para celebrar: tricentenário do nascimento de Charles Wesley. Simei Ferreira de Barros Monteiro et al. São Bernardo do Campo: EDITEO, 2008. 236 p. ISBN 8588410787.